A União Libanesa da Diáspora é uma Associação Brasileira que agrega líderes e membros da Comunidade Libanesa no Brasil com sede em São Paulo.

Adib Jatene, filho de um libanês de Beit Mellat em Akkar, referência de humanismo e sucesso na Medicina

Adib Domingos Jatene nasceu em Xapuri (AC) no dia 4 de junho de 1929, filho de Domingos Antônio Jatene e de Anice Adib Jatene. Seu pai, um pequeno comerciante, faleceu em 1931, vitimado pela febre amarela. Entrou na faculdade de engenharia, mas deixou esta área no último ano de estudos. Em 1948 entrou na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), pela qual se formou em 1953. Toda a sua pós-graduação foi feita no Hospital das Clínicas da USP, sob a orientação de Euclides Zerbini, que se tornaria o pioneiro em cirurgia de transplante de coração na América Latina.

Entre agosto de 1955 e dezembro de 1957 Adib Jatene estabeleceu-se em Uberaba (MG).  Professor de anatomia topográfica da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro, ali realizou as primeiras cirurgias torácicas da região. Em Uberaba construiu seu primeiro modelo de coração-pulmão artificial. Em 1958 retornou a São Paulo, como cirurgião do Hospital das Clínicas e do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, da Secretaria de Saúde. Naquele período desenvolveu o primeiro aparelho coração-pulmão artificial do país, o que propiciou a criação do Departamento de Bioengenharia daquele hospital.

De 1961 a 1979 dedicou-se com quase exclusividade ao Instituto Dante Pazzanese, onde foi, sucessivamente, chefe do Laboratório Experimental de Pesquisa, chefe da Seção de Cirurgia e diretor-médico e diretor-geral do instituto, além de ter organizado a Oficina de Bioengenharia. Durante esse período foi diretor-geral do Hospital do Coração Sírio-Libanês, desde 1977, e sócio fundador e primeiro presidente da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (1977-1979).

De 1979 a 1982 ocupou seu primeiro cargo público, na qualidade de secretário de Saúde na administração do prefeito Paulo Maluf.  Em 1980 foi fundador e o primeiro presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Em 1983, com a aposentadoria do professor Zerbini, venceu o concurso para substituí-lo na cátedra de professor-titular de cirurgia torácica da Faculdade de Medicina da USP, tendo assumido, também, o cargo de diretor do Instituto do Coração (Incor).

Ainda durante a década de 1980, tornou-se membro de diversas associações médicas, entre as quais a Sociedade Brasileira de Cardiologia/Departamento de Cirurgia Cardiovascular (da qual foi presidente entre 1981 e 1985), a American Society for Thoracic Surgery (da qual foi membro honorário — 1981), a Sociedade Brasileira de Cardiologia e a Sociedade Internacional de Cirurgia Cardiovascular (tendo sido presidente de ambas entre 1985 e 1987) e a Academia Nacional de Medicina (da qual foi membro titular em 1989). Iniciou, ainda, sua participação em conselhos e comissões, cujos trabalhos iriam se estender na década de 1990.

No Ministério da Saúde

Em janeiro de 1992, Alceni Guerra, ministro da Saúde do governo de Fernando Collor de Melo (1990-1992) tornou-se alvo de denúncias na imprensa por omissão, diante do surto de cólera que, invadindo a Amazônia, se espalhara pelo Nordeste do Brasil. Alceni Guerra foi também acusado de corrupção na compra de materiais para o programa de agentes comunitário de saúde. Anos mais tarde, o ministro viria a ser inocentado das denúncias de corrupção. Diante das pressões, Alceni foi afastado da pasta e substituído, interinamente, por José Goldemberg, então secretário de Ciência e Tecnologia. Em meados de fevereiro, Jatene assumiu o ministério, por sugestão do ministro da Justiça, Jarbas Passarinho.

Logo ao assumir o cargo, Jatene afirmou que os governantes eram prejudicados pelas empreiteiras, que influenciavam na elaboração e na aprovação dos orçamentos municipais, estaduais e federais, no sentido da construção de obras desnecessárias. Disse também que o impacto da construção de hospitais sobre a redução das doenças era praticamente inexistente e que seu projeto de gestão seria voltado para a prevenção, implicando imunização, saneamento básico e educação sanitária. Anunciou o plano de erradicação do sarampo, do tratamento de esgotos no Nordeste e a implementação do trabalho de agentes comunitários de saúde, que havia sido suspenso em decorrência do comprovado superfaturamento em licitações para compras relativas ao programa.

Jatene encontrou o Ministério da Saúde em situação difícil. Os impostos denominados Contribuição de Instituições Financeiras (Cofins) e Finsocial, que contribuíam com quase 60% do orçamento da saúde, não eram recolhidos graças a liminares concedidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Diante desse fato, Jatene agendou encontros com as principais associações classistas de banqueiros e de empresários para convencê-los a pagar os impostos devidos. Obteve resultados significativos, o que foi atribuído pela imprensa, em parte, ao fato de muitos dos empresários de maior peso na economia brasileira terem sido seus pacientes em cirurgias. Jatene por sua vez, deixava claro que não se sentia credor de quem porventura tivesse operado.

Obtendo empréstimo do Fundo de Amparo aos Trabalhadores (FAT) Jatene pôs em dia os pagamentos aos hospitais conveniados com o Sistema Único de Saúde (SUS), independentemente do resultado das auditorias que estavam em andamento, em parceria com o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) para apurar denúncias de fraudes no sistema.

Mesmo com a revelação da existência de um vasto esquema de corrupção no governo Collor, Jatene reafirmou seus compromissos com o ministério, afirmando que o presidente aprovava seus projetos na pasta. Permaneceu no cargo até outubro, quando o vice-presidente Itamar Franco assumiu, interinamente, a presidência em razão do afastamento de Collor para que o pedido de impeachment contra ele apresentado pudesse ser julgado pelo Senado. Jatene foi substituído pelo médico e parlamentar Jamil Haddad (PSB). Collor renunciou ao mandato presidencial em 19 de dezembro, horas antes de o Senado decidir pelo seu impedimento. Itamar foi então confirmado na presidência.

Retomando a prioridade de atuação na USP e no Incor, dos quais não se afastara durante o período em que fora ministro, Jatene recusou o convite para ser secretário de Saúde no novo governo municipal de Paulo Maluf, em 1993.

Em janeiro de 1995, convidado pelo presidente eleito e recém-empossado Fernando Henrique Cardoso assumiu, pela segunda vez, o Ministério da Saúde. O cargo foi-lhe transmitido pelo último titular da pasta no governo Itamar, Henrique Santillo.

De imediato, Jatene determinou a apuração de fraudes, que, por meio das guias de Autorização Hospitalar (AHs), eram praticadas por hospitais e clínicas conveniadas, ameaçando a suspender os pagamentos a instituições sob suspeita. Em fevereiro, exonerou Augusto Franco, irmão do ex-presidente Itamar, chefe da representação do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro, que era acusado de má administração.

Contrariando orientação do presidente, em fevereiro divergiu publicamente do secretário da Administração Federal, Luís Carlos Bresser Pereira, e defendeu a manutenção da estabilidade no emprego para os servidores públicos. Em seguida polemizou com o ministro do Planejamento, José Serra, que defendia a abertura dos serviços de saúde ao capital estrangeiro. Defensor da abertura a grupos estrangeiros apenas em áreas não atendidas pelo governo ou por entidades particulares brasileiras, Jatene era, por outro lado, favorável à participação de empresas do exterior na área de seguro-saúde.

Em março o governo editou uma medida provisória que, entre outros aspectos, desobrigava a União de pagar pensionistas e aposentados quando não houvesse recursos próprios da Previdência. E, ainda, permitia ao Tesouro Nacional reter, por tempo indeterminado e sem correção monetária, o total de recursos do Programa de Integração Social (PIS) e da Cofins, destinados à área social. Jatene, apoiado pelo ministro da Previdência, Reinhold Stephanes, manifestou seu descontentamento aos ministros Serra e Pedro Malan, da Fazenda, os responsáveis pela medida.

Lembrando que o orçamento para a Saúde caíra 49,5% em relação ao ano anterior, Jatene empenhou-se junto ao Congresso para a aprovação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que, paradoxalmente era defendida pelos parlamentares da oposição e combatida pelas lideranças governistas. Em meio ao debate parlamentar, Serra e Malan passaram a estimular a aprovação do novo imposto, com a condição de que os recursos arrecadados fossem destinados ao pagamento da dívida interna do governo federal.

Em setembro, o ministro anunciou a economia de mais de cem milhões de dólares com a suspensão de pagamentos a instituições que fraudaram o SUS. Entretanto, naquele mesmo mês a imprensa denunciou a impunidade de empresas fraudadoras cujos proprietários eram deputados federais e estaduais do Partido da Frente Liberal (PFL) baianos. Houve, também, denúncias de favorecimento à Fundação Adib Jatene, do Instituto Dante Pazzanesi, de São Paulo.

Em janeiro de 1996, o presidente Fernando Henrique Cardoso ao apontar Paulo Renato Sousa, responsável pela pasta da Educação, como o seu melhor ministro, manifestou seu descontentamento em relação a Jatene, alegando que o mesmo se havia transformado em um “ministro dos hospitais”, não tendo implementado o projeto global de saúde preventiva. O ministro retrucou que era o próprio governo quem negava os meios necessários à realização de seus projetos prioritários. Ainda em março, Jatene foi acusado de autorizar a compra de vacinas a preços superfaturados. Solicitado a se manifestar sobre o assunto, qualificou os cartéis de fabricantes de “verdadeiras quadrilhas”.

Durante o primeiro semestre de 1996, casos de mortes em série em clínicas conveniadas escandalizaram o país. De fevereiro a março, 61 pacientes renais agudos morreram de hepatite tóxico, adquirida durante tratamento no Instituto de Doenças Renais de Caruaru (PE). Em maio, veio a público a notícia da morte de 99 pessoas idosas, num período de 75 dias, na Clínica Santa Genoveva, no Rio de Janeiro. Nessas situações o ministério foi acusado de negligência.

No dia 27 de julho, após um ano e meio de tramitação a CPMF foi finalmente aprovada pela Câmara dos Deputados. Isso não significou sua implementação imediata, pois a criação da contribuição teria, ainda, que ser apreciado pelo Senado e, se aprovada, sancionada pelo presidente da República, o que só veio a acontecer em outubro. Anteriormente, o Supremo Tribunal Federal (STF) já determinara que o novo imposto só poderia ser cobrado a partir do ano seguinte.

No mesmo mês, 35 crianças recém-nascidas morreram contaminadas por uma bactéria numa maternidade em Boa Vista e mais contaminações e mortes, acima do normal, de recém-nascidos ocorreram  em Fortaleza e em Niterói (RJ).

No dia 6 de novembro, Jatene  solicitou sua exoneração do cargo de ministro. Atendido pelo presidente, foi substituído interinamente pelo secretário-executivo da pasta, Carlos César de Albuquerque.

Ao deixar o ministério, a imprensa em geral atribuiu a Jatene o mérito da aprovação da CPMF, visto como forma de resolver em grande parte, o crônico problema da falta de recursos para a área da saúde. Reconheceu sua preocupação permanente em disciplinar e sanear o SUS e de ter elaborado o projeto de lei regulamentando a atuação das empresas administradora de planos de saúde. Houve ampliação de número de agentes comunitários de saúde, do programa de distribuição de leite, de vacinação e de assistência a gestantes. Segundo projeções do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), essas ações teriam contribuindo para a diminuição do índice de mortalidade infantil no país. Durante sua gestão, ainda segundo a imprensa, foram intensificadas campanhas de esclarecimento sobre a Aids, o tabagismo e a hipertensão, entre outras.

Deixando o ministério Jatene retomou suas atividades de professor da USP e de diretor do Incor.

Em setembro de 1997, protestou contra o desvio de recursos da CPMF para reforçar o caixa do Tesouro Nacional. Em abril do ano seguinte voltou a denunciar o corte de verbas para a saúde. Em maio afirmou: “O governo opta pela macroeconomia e enterra a saúde.” Em junho aposentou-se como professor-titular da Faculdade de Medicina da USP. Ainda em 1998 foi eleito membro honorário da American Surgical Association e do American College of Surgeons, além de ter sido agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico.

Em 2005, passou a dirigir o Hospital do Coração de São Paulo (HCor). Em 2008, tornou-se presidente da comissão de medicina do Ministério da Educação, responsável por supervisionar a qualidade dos cursos em todo o país. No ano seguinte recebeu o prêmio Professor Emérito – Troféu Guerreiro da Educação 2009, troféu oferecido a personalidades consideradas exemplos na área acadêmica pelo Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) e pelo O Estado de S. Paulo.

Casou-se com Aurice Bisceli Jatene, com quem teve quatro filhos.

Membro de 32 sociedades científicas em todo o mundo, recebeu 178 títulos e honrarias em mais de dez países. Autor ou co-autor de mais de setecentos trabalhos publicados no Brasil e no exterior, Jatene tornou-se detentor de patentes sobre equipamentos da área de bioengenharia. Desenvolveu diversas técnicas na área de cirurgia cardiovascular, adotadas em vários países. Desde 1962 as equipes sob sua liderança realizaram mais de 80 mil cirurgias.

Fonte: Musa Velasquez / Sinclair Cechine – FGV-CPDOC

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